Apesar da relutância em aceita-la considerando, especialmente, o impacto para os pequenos municípios, a regra que está no projeto da nova lei de licitações, inegavelmente, é esta: a licitação será conduzida pelo agente de contratação (art. 8º), que no caso do pregão será designado pregoeiro (art. 8º, §5º) e, por sua vez, o agente de contratação/pregoeiro deverá ser designado entre servidores efetivos ou empregados públicos dos quadros permanentes da Administração Pública (art. 6º, LV).
Passada a surpresa inicial, é possível enxergar uma lógica considerando o conjunto da obra. Se 1) os entes federativos deverão instituir centrais de compras (art. 180), 2) os municípios pequenos deverão, preferencialmente, reunir-se em consórcio (art. 180, parágrafo único) e ainda poderão, com um claro estímulo normativo, 3) aderir a atas de registro de preços de outros municípios, dos estados e da União (art. 85, §2º), aparentemente a exigência de cargo efetivo para o pregoeiro produziria poucas, ou não produziria, externalidades negativas.
Este pode parecer, para alguns, o mundo ideal, mas convenhamos que, por mais que a norma posta seja, por excelência, uma ferramenta indutora de políticas públicas, a realidade muitas vezes não favorece sua implementação. Como dizem por aí, é preciso “combinar com os russos” – e, no caso, eles não são poucos! Então, talvez estejamos falando de mais uma das tantas normas que não encontram eco nos fatos da vida real.
Mas há uma uma incoerência quando o PL dispõe que, para a função de fiscal de contrato, de natureza similar, senão idêntica à do pregoeiro, é apenas preferencial que o servidor seja ocupante de cargo efetivo ou empregado do quadro permanente (art. 7º, inc. I c/c art. 116). Não vejo razão para a distinção, já que o suposto risco de delegar ambas as funções a alguém que tenha sido livremente nomeado me parece exatamente o mesmo. Aliás, particularmente, por convicções próprias, não vejo risco algum.
A explicação, segundo me alertou o querido amigo Rafael Oliveira, pode estar no fato de que, na estrutura do PL, o fiscal não é um agente “da contratação”. De fato, esta função, segundo o PL, apesar da amplitude pressuposta na nomenclatura, atrela-se somente à licitação (a propósito, pontuo aqui, para reflexão, que enquanto o pregoeiro continua sendo Pregoeiro, os demais, apesar de ocuparem a mesma função, são “meros” agentes da contratação…). Pode ser, também, que o receio de impossibilitar a designação de especialistas no objeto como fiscais de contrato esteja por trás dessa regra mais frouxa. De todo modo, continuo entendendo que os dispositivos não conversam entre si.
Entre concordâncias e discordâncias -e voltando ao ponto inicial -, considerando a quase impossibilidade de veto, já que isso geraria um vácuo normativo incompatível com o caráter analítico do texto do PL, vamos torcer para que, promulgada a nova lei, a exigência não comprometa a eficácia da função, nem prejudique fatalmente a forma com que os municípios organizam seu setor de licitações. De novo, todavia, enxergo mais de Brasília do que de Brasil no texto da futura nova lei de licitações.